sábado, 10 de fevereiro de 2007

A Fuga de Quadros de Saúde Africanos!



Um excelente artigo de Lali Cambra, publicado no diário espanhol El País, deu-me o mote para a crónica de hoje, centrada na problemática dos quadros de saúde na África subsariana.
A África "exporta" vinte e três mil profissionais de saúde por ano para os países desenvolvidos! Estes números são da Organização Mundial da Saúde! E no entanto, a mesma África, tem carência de médicos e enfermeiros, e os poucos que tem, partem. Partem para reforçar os quadros médicos dos hospitais do Reino Unido, dos EUA, França e até da Austrália. É uma "sangria" que agudiza a crise dos sistemas de saúde do continente, já de si frágeis, para fazer face aos graves problemas sanitários que se colocam à África, nomeadamente no que respeita ao combate ao HIV/Sida e à malária, para citar apenas os dois maiores flagelos que afectam os africanos. A OMS calcula que o défice de médicos em África, seja de cerca de um milhão. Esta situação condiciona a prestação dos cuidados de saúde às populações e consequentemente o desenvolvimento económico e social africano, ameaçando além do mais, o cumprimento até 2015, dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, das Nações Unidas. A continuar esta "hemorragia" dos quadros, muitos dos sistemas de saúde africanos correm o risco de entrarem em colapso. A fuga dos quadros de saúde, tem registado uma evolução meteórica: na década de 70, emigravam cerca de dois mil médicos por ano; nos anos 80, já eram cerca de oito mil, e actualmente cerca de vinte e três mil. Entre 2000 e 2004 saíram da África do Sul, perto de quatro mil médicos, sobretudo para a Nova Zelândia e Austrália, segundo a Ordem dos médicos daquele país. E o resultado é a existência de mais médicos etíopes em Chicago do que
na Etiópia; mais médicos ganenses a trabalhar no estrangeiro do que no Ghana; mais médicos guineenses em Portugal do que na Guiné-Bissau, para apenas citar alguns exemplos.
A fraca remuneração auferida nos países de origem, não é a única razão, para explicar o êxodo! A falta de recursos técnicos nos hospitais, as escassas possibilidades de promoção e de especialização, e a sobrecarga de trabalho, são outras tantas, às quais se acrescenta as políticas activas de contratação por parte dos países desenvolvidos. Em 1997 Nelson Mandela criticou a conduta do Reino Unido nessa matéria, o que levou os britânicos a aprovarem normas de conduta ética em matéria de contratação de pessoal médico e para-médico em países africanos. Mas infelizmente, os seus efeitos foram quase nulos, pois os hospitais privados continuaram a contratar! E continuarão, porque o Reino Unido necessita para os próximos anos mais de 200 mil profissionais, e os EUA de cerca de um milhão, de acordo com Regina Keith da ONG Save the Children. O envelhecimento da população nos países ricos, aliados a uma política inadequada de formação de pessoal próprio ( veja-se o caso português, onde a exigência de elevadisimas médias para o acesso ao curso de medicina, tem redundado numa escassez de médicos ), gerou uma procura nos países ricos que encontar oferta nos países pobres. Perante a dramática realidade que se vive no sector da saúde, alguns países africanos, pretendem inverter a actual fuga de cérebros ( brain drain ) num retorno dos mesmos ( brain gain ). Tarefa nada fácil, pois sabe-se que a maioria desses países atravessa uma crise económica e financeira de carácter estrutural. O apoio da comunidade internacional nesta matéria, poderá ser determinante, para a materialização de tal "desiderato". Mas a questão financeira não é tudo! Os governos africanos deverão empenhar-se na promoção de políticas que integrem: a boa governação; a estabilidade política e social; e uma clara estratégia para o sector da saúde, que tenha em consideração as condições de trabalho hospitalar, as questões remuneratórios entre outros aspectos. Sem políticas bem definidas para o sector, a África continuará a ser um fornecedor de quadros aos países ricos, ajudando-os a serem cada vez mais saudáveis e ricos, em detrimento dos seus filhos! Mais uma vez o Ocidente vai-se desenvolvendo à custa de África! Agora sem tráfico negreiro, nem trabalho forçado! Apenas explorando a pobreza do continente!