quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

Poluição e Morte em Abidjã: O Caso do Probo Koala





Faz agora seis meses, que o navio tanque Probo Koala, pertencente a um armador grego, arvorando pavilhão panamiano e com tripulação russa, atracou no porto de Abidjan, com 580 toneladas de carga, declarada como águas de lavagens dos porões ou os chamados “slops”.Este produto foi bombeado pela empresa marfinense Tommy e depois vazado em esgotos em 16 locais dos arredores da capital económica da Costa do Marfim. As consequências dessas descargas foram de imediato sentidas pela população, através do odor pestilento que emanava daquele efluente, e que provocava irritações nasais e oculares, dores no peito e de cabeça e mal-estar geral. O resultado foram milhares de pessoas intoxicadas, centenas de hospitalizações e 15 mortos, contabilizados até este momento! Analizados os produtos transportados pelo Probo Koala verificou-se que os mesmos continham sulfito de hidrogénio, mercaptans e soda cáustica. Uma combinação altamente tóxica e cancerígena. Perante esta catástrofe humana e ambiental, que resultou da negligência ou da corrupção dos agentes responsáveis pela trâmitação deste tipo de cargas, o 1º Ministro Charles Konan Banny, responsabilizou o governador do distrito de Abidjan, o director-geral das alfandegas e o director do porto autónomo de Abidjan, que foram suspensos após inquérito, ficando a aguardar julgamento. Ao mesmo tempo o governo moveu uma acção judicial contra a empresa Trafigura Beeher afretador do referido navio. Para Konan Banny, este caso deveria ser tratado de forma exemplar de modo a servir de símbolo do fim da impunidade na Costa do Marfim e ao mesmo tempo, transmitir uma mensagem clara à comunidade internacional e em especial aos países industrializados, que essas práticas não seriam mais toleradas. Banny, chegou mesmo a pedir a demissão,e a do seu governo, por considerar de extrema gravidade o escândalo do Probo Koala, uma atitude muito rara em África, tendo sido de novo indigitado para formar governo, em parte devido à pressão das N. Unidas e da comunidade Internacional.
Infelizmente, as boas intenções, com que este assunto foi tratado pelo 1º Ministro, Charles Konan Banny, foram goradas devido à actuação pouco ortodoxa do presidente Gbagbo! Recorde-se que Laurent Gbagbo, terminou o seu mandato em Outubro de 2005, mas em virtude da persistência do conflito interno, as Nações Unidas concordaram com a sua manutenção no poder, desde que fosse indigitado um 1º Ministro independente para dirigir um governo de unidade nacional, que criasse condições para novas eleições. Eleições essas que têm vindo a ser adiadas devido a manobras dilatórias do próprio presidente e do seu partido, a Frente Popular Marfinense ( FPI ). Pois bem, nesta questão do Probo Koala, Gbagbo, actuou como senhor todo poderoso, sem consultar o 1º Ministro, e indo ao arrepio das decisões por este tomadas.
Determinou a reintegração dos funcionários suspensos e que aguardavam a tramitação de processo judicial; e no dia 13 de Fevereiro deste ano, assinou um acordo amigável, com a Trafigura Beeher, em que esta empresa multinacional se compromete a pagar uma indemnização no valor de 152 milhões de Euros, em troca da desistência do processo judicial contra ela intentada pelo governo. Tudo isso feito sem participação ou conhecimento por parte das autoridades com responsabilidade na matéria!
E assim, as 15 vidas perdidas, e a saúde arruinada de milhares de marfinenses, acabaram por ser trocadas por alguns euros. Ainda que o montante possa parecer significativo, o valor da Vida Humana e a questão ética, deveriam estar acima da mera transação comercial. Convenhamos que todo este processo foi mal conduzido pelo Presidente da República. E como Chefe de Estado, Laurent Gbagbo deveria ser o primeiro defensor do interesse nacional!O que se pretendia com o processo judicial, tinha um duplo objectivo: por um lado, provar que ninguém estava acima da lei e que o fim da impunidade tinha finalmente chegado à Costa do Marfim; e por outro, obter uma justa reparação pelos danos causados ( que certamente seria bem maior do que a obtida no acordo amigável), e que a condenação, servisse de aviso a potenciais prevaricadores!
Seria uma boa forma de dizer ao Mundo que a Costa do Marfim e a própria África, não podem transformar-se na cloaca, dos países ricos e industrializados!

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Estudantes Guineenses em Dificuldades na Rússia



Investir na educação e na formação, constitui uma das melhores estratégias que os países têm, para conseguirem um elevado e sustentável nível de desenvolvimento económico e social! Pode-se mesmo afirmar que o investimento em educação, ciência e tecnologia, são decisivos para o desenvolvimento humano, social e económico de um país! Há mesmo quem considere a educação como um insumo e o desenvovimento económico como o produto final ou o “output”.
Por conseguinte, não haverá progresso sem uma escolaridade qualificada. A história recente é bem demonstrativa desta asserção! Ao analisarmos países bem sucedidos, em termos de progresso económico e social, como são os casos dos quatro tigres asiáticos (Coreia do Sul, Taiwan,Hong Kong, e Singapura ) a China, a Irlanda ou a Espanha, para apenas citar alguns, que eram há pouco mais de trinta anos, países com sérias dificuldades sócio-económicas e baixos níveis de crescimento, notamos que possuem em comum, o facto de terem dado prioridade ao ensino, e ensino de qualidade para a sua população. E como resultado, são países que registam hoje um alto nível educacional tendo conseguido em poucos anos, feitos assinaláveis no domínio do desenvolvimento económico e humano, patentes em elevadas taxas de crescimento, melhoria no nível de emprego, significativo aumento do rendimento “per capita” e das exportações, para alé de serem merecedores de um grande respeito internacional. Este “intróito” vem a propósito da dramática situação em que se encontram os estudantes bolseiros guineenses na Federação Russa, que há dois anos não recebem a parca ( para não dizer miserável ) bolsa de 50€ por mês. Para sobreviverem alguns conseguem arranjar biscates, tabalhos nocturnos em discotecas, ou outro tipo de ocupação que lhes permita ganhar alguns rublos. Outros vivem da caridade dos estudantes gambianos que recebem uma bolsa do seu país seis vezes maior do que a dos guineenses. Chegaram a pensar ocupar de novo a Embaixada como forma de protesto e para chamar a atenção do governo para a situação em que se encontram! Porém o reforço da segurança na representação diplomática e o imenso frio que se faz sentir nesta altura, e a debilidade em que alguns se encontram, levaram-nos a desistir! São 53, o número actual de estudantes guineenses na Rússia. Outros, tendo terminado os seus cursos regressaram ao país, sem contudo terem levado consigo os seus diplomas, por não lhes terem sido entregues, devido à dívida que o governo guineense tem para com as instituições de ensino russas. Todos os quadros, fazem falta ao país, incluindo aqueles que se formaram ou estão em vias de se formarem na Federação Russa. Eles serão os dirigentes de amanhã, e o garante de um futuro melhor para a Guiné-Bissau. O país tem uma enorme carência de quadros a todos os níveis, e não pode dar-se ao luxo, de neglegenciar a formação dos mesmos. A Guiné -Bissau para se desenvolver e tornar-se competitivo precisa de gente qualificada e de boa capacidade técnico-profissional! Assim sendo, terá de apostar numa política de educação e formação de qualidade e de grande abrangência! O país não pode hipotecar o seu futuro! Por isso terá de investir na valorização do seu capital humano!
Conhecemos bem a real dimensão da crise guineense e sabemos que a situação financeira do país não é de molde a permitir a resolução de todos os problemas que se colocam ao governo! Mas há problemas e problemas! Há que definir prioridades. O que está em jogo é a sobrevivência de cidadãos guineenses, num país onde reina grande intolerância racial, a xenofobia e uma hostilidade inusitada para com os estudantes africanos. E é também, a própria dignificação do Estado Guineense que está em causa. Urge por conseguinte, uma resposta adequada por parte das autoridades guineenses, por forma a minorar o enorme sofrimento que esses nossos concidadãos estão a atravessar, permitindo-lhes assim, dar continuidade aos seus estudos, com maior dedicação, motivação e empenhamento.
Há que saber semear hoje, para colher amanhã!

sábado, 10 de fevereiro de 2007

A Fuga de Quadros de Saúde Africanos!



Um excelente artigo de Lali Cambra, publicado no diário espanhol El País, deu-me o mote para a crónica de hoje, centrada na problemática dos quadros de saúde na África subsariana.
A África "exporta" vinte e três mil profissionais de saúde por ano para os países desenvolvidos! Estes números são da Organização Mundial da Saúde! E no entanto, a mesma África, tem carência de médicos e enfermeiros, e os poucos que tem, partem. Partem para reforçar os quadros médicos dos hospitais do Reino Unido, dos EUA, França e até da Austrália. É uma "sangria" que agudiza a crise dos sistemas de saúde do continente, já de si frágeis, para fazer face aos graves problemas sanitários que se colocam à África, nomeadamente no que respeita ao combate ao HIV/Sida e à malária, para citar apenas os dois maiores flagelos que afectam os africanos. A OMS calcula que o défice de médicos em África, seja de cerca de um milhão. Esta situação condiciona a prestação dos cuidados de saúde às populações e consequentemente o desenvolvimento económico e social africano, ameaçando além do mais, o cumprimento até 2015, dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, das Nações Unidas. A continuar esta "hemorragia" dos quadros, muitos dos sistemas de saúde africanos correm o risco de entrarem em colapso. A fuga dos quadros de saúde, tem registado uma evolução meteórica: na década de 70, emigravam cerca de dois mil médicos por ano; nos anos 80, já eram cerca de oito mil, e actualmente cerca de vinte e três mil. Entre 2000 e 2004 saíram da África do Sul, perto de quatro mil médicos, sobretudo para a Nova Zelândia e Austrália, segundo a Ordem dos médicos daquele país. E o resultado é a existência de mais médicos etíopes em Chicago do que
na Etiópia; mais médicos ganenses a trabalhar no estrangeiro do que no Ghana; mais médicos guineenses em Portugal do que na Guiné-Bissau, para apenas citar alguns exemplos.
A fraca remuneração auferida nos países de origem, não é a única razão, para explicar o êxodo! A falta de recursos técnicos nos hospitais, as escassas possibilidades de promoção e de especialização, e a sobrecarga de trabalho, são outras tantas, às quais se acrescenta as políticas activas de contratação por parte dos países desenvolvidos. Em 1997 Nelson Mandela criticou a conduta do Reino Unido nessa matéria, o que levou os britânicos a aprovarem normas de conduta ética em matéria de contratação de pessoal médico e para-médico em países africanos. Mas infelizmente, os seus efeitos foram quase nulos, pois os hospitais privados continuaram a contratar! E continuarão, porque o Reino Unido necessita para os próximos anos mais de 200 mil profissionais, e os EUA de cerca de um milhão, de acordo com Regina Keith da ONG Save the Children. O envelhecimento da população nos países ricos, aliados a uma política inadequada de formação de pessoal próprio ( veja-se o caso português, onde a exigência de elevadisimas médias para o acesso ao curso de medicina, tem redundado numa escassez de médicos ), gerou uma procura nos países ricos que encontar oferta nos países pobres. Perante a dramática realidade que se vive no sector da saúde, alguns países africanos, pretendem inverter a actual fuga de cérebros ( brain drain ) num retorno dos mesmos ( brain gain ). Tarefa nada fácil, pois sabe-se que a maioria desses países atravessa uma crise económica e financeira de carácter estrutural. O apoio da comunidade internacional nesta matéria, poderá ser determinante, para a materialização de tal "desiderato". Mas a questão financeira não é tudo! Os governos africanos deverão empenhar-se na promoção de políticas que integrem: a boa governação; a estabilidade política e social; e uma clara estratégia para o sector da saúde, que tenha em consideração as condições de trabalho hospitalar, as questões remuneratórios entre outros aspectos. Sem políticas bem definidas para o sector, a África continuará a ser um fornecedor de quadros aos países ricos, ajudando-os a serem cada vez mais saudáveis e ricos, em detrimento dos seus filhos! Mais uma vez o Ocidente vai-se desenvolvendo à custa de África! Agora sem tráfico negreiro, nem trabalho forçado! Apenas explorando a pobreza do continente!

Relação África-China




Tem havido muito “alarido” à volta da viagem do presidente da China, Hu Jiatao a vários países africanos!E a propósito, os jornais, as rádios e as televisões têm dedicado amplo espaço à presença chinesa em África! Citam-se números, analisa-se a evolução, fazem-se projecções! Quanto a conclusões, as opiniões dividem-se! A maioria aponta para o perigo que a parceria China-África representa para a democratização do continente africano, já que os grandes financiamentos e investimentos chineses não têm qualquer condicionalidade, nem de boa governação, nem de respeito pelos direitos humanos! Há mesmo quem aponte para uma dominação do tipo neocolonial, não acreditando no princípio da vantagem recíproca, ou de ganhadorganhador anunciado em Janeiro de 2006 pelo governo chinês na sua carta de politica para Africa.
O perigo chinês pode existir!Ninguém nega essa possibilidade! Mas a tentação hegemónica do Império do Meio, depende daquilo que os governos africanos permitirem! E se a memória não fôr curta, deverão lembrarse do que foi o colonialismo, que mergulhou o continente numa longa noite da sua história. Apesar de todos os "perigos" sempre é melhor ter mais um parceiro ( ou dois, contando com a India ) de desenvolvimento, do que continuar enfeudado ao ocidente do G8 que muito promete e pouco tem feito pelo continente. Em 2005, Tony Blair e John Gordon, lançaram com toda a pompa e circunstância, a Comissão para África, cujo relatório intitulado “Nosso Interesse Comum” faz o diagnóstico dos problemas africanos, e aponta soluções, que passam por massivos investimentos que o G8 deveria financiar!
Volvidos quase dois anos, continua tudo como dantes! E no entanto o Ocidente tem responsabilidades morais para com a Africa, se não vejamos:
1.Foram responsáveis por séculos de colonização com os resultados que se conhece;
2.Balcanizaram o continente, criando territórios administrativos que nada tinham a ver com as fronteiras interétnicas, o que tem originado vários conflitos até aos dias de hoje;
3.Deixaram poucas infraestruturas;
4.Investiram muito pouco na formação e na educação ( isto é, na valorização do capital humano );
5. Não prepararam élites para a governação pósindependência;
6. Têm vindo a matar a actividade agrícola africana com subsídios dados pelos países do G8 aos seus agricultores, que podem assim exportar a preços altamente concorrenciais, ( isso em economia chama-se "dumping" );
7. Os termos de troca têm sido desfavoráveis ao continente devido às políticas económicas dos países ricos;
8. O Investimento Directo Estrangeiro do G8 em África é marginal, e representa menos de 2% do IDE mundial.

É evidente que para o atraso de Africa contribuem outras causas! Causas de carácter endógeno, nomeadamente a questão da boa governação, a corrupção ( atenção a este factor! Onde há corruptos há corruptores, e estes quem são? ), as pandemias do HIV/Sida e da malária os conflitos étnicos ( devido à partilha de Africa realizada em 1884/85 na Conferência de Berlim, que não tomou em consideração as fronteiras étnicas existentes ) e os desastres naturais ou calamidades. O resultado de tudo isso, é a pobreza generalizada , que tem contribuído para a vaga de emigrantes, que afluem à Europa, e não só, à procura de melhores condições de vida! Perante essa realidade, a União Europeia, procura gizar uma nova política para Àfrica, que tudo leva a crer, será apresentada na cimeira Europa-África de Novembro de 2007 em Lisboa! O que se pretende é travar o fluxo imigratório! Como? Investindo mais em África, para fixar as populações? Talvez! Aguardemos para ver! Perante todo este panorama, é salutar a presença chinesa ( e Indiana ) em Africa, onde estão a investir em grande escala, construindo e reabilitando infraestruturas, constituindo empresas mistas, perdoando a dívida e fomentando o comércio africano! E deste modo estão a chamar a atenção do G8 e de outros países ricos para o continente até agora esquecido! Pode ser que desta vez os países industrializados dêm mais atenção ao continente negro, e olhem para ele, não como o eterno pedinte, mas como um verdadeiro parceiro de desenvolvimento! E assim sendo, a Africa poderá vir a registar taxas mais elevadas de crescimento económico, permitindo-lhe combater a pobreza, e melhorar as condições de vida da sua população! Esperemos que a Hora de África tenha finalmente chegado!