quarta-feira, 23 de maio de 2007

Recordando José Carlos Schwarz



Foi há trinta anos! Naquela manhã de sol radiante do mês de Maio, encontrei-me com o José Carlos Schwarz no hall do hotel Altis em Lisboa. Trocámos as habituais saudações e ele informou-me que estava em trânsito para Havana e que partiria naquela noite ou no dia seguinte, já não me recordo. Dei-lhe um forte abraço e desejei-lhe boa-viagem! Mal poderia eu imaginar que seria a última vez que o veria. O avião da Aeroflot em que seguia para Cuba despenhar-se-ia na aproximação ao aeroporto internacional José Marti em Havana. Fiquei incrédulo quando soube da notícia! A Guiné-Bissau acabava de perder um combatente e um dos seus expoentes máximos no domínio músical, e nós um amigo.
José Carlos Schwarz é uma referência incontornável da música guineense! A faceta interventiva das suas composições, perspassa por toda a sua obra. Ele foi, sem sombra para dúvidas um cantor interventor! O legado deixado por José Carlos Schwarz, é uma referência para todos aqueles que não se conformam e continuam a lutar pela mudança e por um futuro melhor.
Os temas por ele composto e cantado, são de uma grande actualidade. A sua mensagem é ainda pertinente e actual.
O cantor e compositor, nunca deixou de abraçar causas e motivos que lhe pareciam justos, nem de lutar contra o conformismo e o espírito acrítico. As sua canções são fruto dessa luta diária, e dessa reflexão constante. A sua influência na tomada de consciência dos guineenses, da realidade politica e social que então se vivia é assinalável. José Carlos Schwarz foi, através da sua música, um mobilizador de consciências para a luta de libertação. Foi um nacionalista, no conceito mais puro do termo, de alguém que ama o país e as suas gentes, sem caír no chauvinismo primário. E isso está patente nas suas canções: nelas tratou temas nacionais na língua nacional, o crioulo, o que revela uma grande consciência nacionalista, não muito vulgar ao tempo.
A sua discografia é notável, não tanto pela pela sua extensão, pois a sua vida foi muito curta, extremamente curta, mas pela sua excepcional qualidade. José Carlos Schwarz deixou-nos temas inesquecíveis, de conteúdo e sonoridade únicas, que penetra no mais profundo do nosso ser, e nos comove e estimula. O que José Carlos nos deixou é música pura! Da crítica social, com "Apili" ou "Minino di Criaçon", ao incentivo à luta, com "Si bu sta diante na Luta", ou ainda com a canção de amor "I son Sodade", não esquecendo o lamento do "Quê qui minino na Tchora", por todos estes temas, perspassa a qualidade artística do compositor e do cantor, e do homem atento à realidade envolvente, que faz dele um cantor comprometido, pois, como dizia Zeca Afonso, "a música é comprometida quando o músico é um homem comprometido! Não é o produto saído desse cantor que define o compromisso, mas o conjunto de circunstâncias que o envolve com o momento histórico e político que se vive e as pessoas com quem ele priva e com quem ele canta". Zé Carlos soube interpretar essas circunstâncias, e soube transmiti-las na sua voz inconfundível, através das suas canções, a todos nós!
Obrigado José Carlos!