quarta-feira, 18 de abril de 2007

A Propósito do Relatório da Liga Guineense dos Direitos Humanos



As organizações da sociedade civil ( OSC ) desempenham um importante papel no apoio e consolidação da democracia e da governação democrática. Na Guiné-Bissau, as organizações da sociedade civil têm vindo a exercer uma função essencial no domínio do exercício da cidadania, que é a todos os títulos louvável. É que o exercício da cidadania não deve limitar-se ao voto, mas ser extensiva a uma participação múltipla e quotidiana dos cidadãos em prol do bem comum. Esta participação activa dos cidadãos, representa uma oportunidade de ampliação dos recursos e competências para enfrentar os grandes desafios nacionais, como o combate à pobreza e o trabalho infantil, a erradicação do analfabetismo e a evasão escolar, a promoção da saúde familiar e comunitária, a corrupção, a defesa dos direitos humanos e da igualdade do género, a degradação do meio ambiente, para apenas citar alguns.

Não obstante a existência de divergências de opiniões e de reinvindicações, o diálogo entre os vários actores governamentais e não governamentais, conduz quase sempre, à definição de uma agenda de consenso, sobre temas e assuntos de interesse comum e de carácter nacional. Esta interacção entre governo e sociedade, é uma das características das democracias contemporâneas, que urge ser introduzida na sociedade guineense. Registamos com agrado, que na formação do novo governo, a sociedade civil tenha sido auscultada, e que se tenham definido formas de participação e colaboração. É um bom sinal!

Alguns sectores governamentais receiam por vezes, a participação da sociedade, por a considerarem uma intromissão em áreas da sua exclusiva competência. A promoção da parceria Estado-Sociedade Civil, não exime o Estado das suas responsabilidades, nem deve ser entendida como uma alienação ou privatização do próprio Estado. Trata-se tão só, de um reconhecimento, que a participação dos cidadãos, é condição indispensável para uma maior eficiência das políticas e dos programas sociais.

Vêm estas considerações sobre o papel da sociedade civil na consolidação da democracia, a propósito da recente publicação pela Liga Guineense dos Direitos Humanos do seu Relatório relativo ao ano de 2006.
A Liga Guineense dos Direitos Humanos, com quinze anos de existência, é uma das importantes organizações da sociedade civil guineense, que vem desenvolvendo um meritório trabalho na defesa intransigente dos direitos humanos na Guiné-Bissau, no quadro das convenções internacionais e do direito guineense. O referido relatório, que me foi enviado por mão amiga, é um documento sucinto, onde se faz uma resenha histórica da situação do país, citando-se alguns dados estatísticos ( a necessitar algumas correcções ) e a denúncia de um conjunto de factos que se prendem com os direitos humanos na Guiné-Bissau. Os factos apontados, são analisados, criticados e responsabilizados de forma clara e inequívoca. Do narcotráfico à mutilação genital feminina, das crianças talibés à questão da independência dos média, da vingança pelas próprias mãos ( vindicta privata ) às prisões arbitrárias, passando pelos direitos à educação e à saúde, sem esquecer o funcionamento da Justiça. O relatório é um autêntico libelo acusatório contra a má governação e o desrespeito pelos direitos humanos fundamentais na Guiné-Bissau. Mas este relatório, não deverá ser encarado, pelo governo, como um ataque, mas sim como uma denúncia de problemas, aos quais urge dar respostas adequadas. É esse o papel das organizações de defesa dos direitos humanos em todo o mundo: denunciar, para que os governos tomem medidas correctivas, de “moto proprio”, e quando não, através da pressão internacional. Um governo que esteja aberto ao diálogo e que queira governar para o bem comum,( objectivo primeiro de qualquer governo democrático) não poderá ignorar as realidades sociais que são denunciadas no presente relatório da Liga Guineense dos Direitos Humanos. Aos governantes, nunca é demais relembrar, que antes de tudo, eles são cidadãos como os demais, e que o poder e as honrarias que lhe confere o cargo público e político são sempre de carácter temporário, e como diz o aforismo latino: “sic transit gloria mundi”, isto é “a glória do mundo é sempre passageira”.