quinta-feira, 12 de abril de 2007

A África e o Ferro: Uma História Antiga



A História, é um daqueles ramos do saber, que provoca frequentes controvérsias! É também uma daquelas disciplinas que cria um grande interesse na generalidade das pessoas. A curiosidade humana sobre o seu passado, tem algo de inato! Costuma dizer-se que um povo sem história, é um povo sem alma! ou, como diz um ditado africano: "Quando não se sabe de onde se vem, não se sabe para onde se vai!". Vem tudo isto a propósito da questão da existência na história da África Subsariana, da actividade de metalúrgia do ferro, num período anterior ao seu aparecimento na Anatólia ou Ásia Menor, que é considerada o seu"berço". Com efeito está hoje provado, que a África desenvolveu a arte do ferro de forma endógena e autónoma, desde o 3º milénio a.C.; ela não a recebeu por empréstimo de outras regiões do mundo, como nos quiseram fazer crer. As primeiras provas, deste facto histórico, surgiram nos anos 50 do séc. XX, quando o etnólogo e arqueólogo francês, Henry Lhote defendeu o carácter intrínsecamente africano da indústria do ferro, contrariando a tese que o conhecimento da metalurgia do ferro entrou na África Subsariana via Núbia ou Saara, a partir do Médio Oriente. Dizia Lhote: "se assim tivesse sido, como explicar por exemplo, a ausência de altos fornos e de ferreiros entre os berbéres saarianos? ou como se explica a originalidade dos foles subsaarianos?" A comunidade científica não o quis ouvir! A maioria dos historiadores tinha ideias preconcebidas: a técnica africana do ferro veio de fora! De acordo com o arqueólogo Bruno Martinelli, se relativamente à cerâmica e à habitação, todo o mundo está em igualdade, quanto à tecnologia do ferro, as coisas complicam-se, pois ela implica um processo de transformação físico-quimico! E no velho esquema de pensamento, a África antiga, era primitiva e selvagem, e portanto não podia ter inventado a metalurgia; apenas a podia ter recebido. A polémica foi relançada nos anos 60 do séc. passado, com as primeiras datações do ferro da cultura Nok na Nigéria que se estende de 3.500 a. c. a 200 anos da nossa era. Mas as datas mais antigas fora recusadas, e hoje estima-se que o ferro tenha aparecido na àfrica Ocidental no início do 1º milénio a.c. Desde então, fizeram-se novas descobertas, em numerosas escavações por todo o continente; do Níger à Tanzânia e África do Sul passando pelos Camarões e República Centro Africana. O sítio de Egaro no Níger Oriental, revelou vestígios datadas de 2.500 anos a.c. cuja homologação se aguarda. A confirmar-se, trata-se de uma antiguidade anterior a do império Hitita ( 2000 a 1300 a.c. ) considerado o "inventor" da metalurgia do ferro. A importância científica destes achados, levou a UNESCO a criar um programa em sua defesa, que é " A Rota do Ferro em África". Perante tanta evidência, qual a razão da resistência da comunidade científica em aceitá-la? De acordo com Suzánne Diop da UNESCO, e coordenadora do referido projecto, “persistem ainda reminiscências ideológicas suspeitas, que defendem, que uma invenção tão importante como a metalurgia não possa ter vindo senão do norte. Para a África têm-se apresentado sucessos nos domínios artísticos, desportivos e até literários, mas no domínio tecnológico é uma novidade!” Para Bruno Martinelli, “trata-se da maior descoberta científica-civilizacional dos últimos tempos em todo o mundo”. Descoberta que pode alterar profundamente a "verdade histórica" até hoje prevalecente sobre a África e suas civilizações. Esperemos que"a cegueira científica devido à ideologia preconceituosa" como diz a jornalista Nadia Khoury-Dagher, não se sobreponha à verdadeira ciência, que é suposto ser, isenta e desprovida de preconceitos de ordem, ideológica, doutrinal, filosófica, religiosa e política! E se assim fôr, estaremos a reescrever um capítulo importante da História de África e da Humanidade.